O CASO DA PRISÃO DO PROMOTOR
Foi  a notícia da semana: “defensora pública prende promotor de justiça”.  Minha reação imediata foi uma onomatopeia (tsk, tsk, tsk). Sem precisar  discutir a “causa”, lembremos: no meio do júri, o promotor teria  proferido palavras ofensivas à juíza. A defensora teria dito à juíza:  ele está lhe desacatando. Prenda-o... A juíza disse que isso era caso  para a Corregedoria. Ato contínuo, a defensora disse algo do tipo “então  o prendo eu”. E o fez, segundo ela, como “qualquer do povo”...!
QUEM PODE PRENDER?
A  aguerrida defensora deveria ter lido a Lei 8.625 (art. 40), o Código de  Processo Penal e a Constituição. Pela Lei, um Promotor somente pode ser  preso em flagrante por crime inafiançável ou por ordem escrita do  Tribunal (nem de um juiz a ordem pode ser); pelo CPP, sabe-se que  qualquer do povo só prende quando não tiver autoridade para  determiná-la; e, pela Constituição, sabe-se que, ao contrário da  defensora, o Promotor possui foro privilegiado.
A SUCESSÃO DE EQUÍVOCOS
Um  júri não é um circo. Não deve servir para bate-bocas e disputas  corporativas. O Promotor, com seu comportamento, “não se ajuda nem um  pouquinho”, como se diz lá no Itaqui. Entretanto, se assacou ofensas,  isso é matéria para processo criminal e administrativo, feitos a  posteriori. Mas, insisto, mesmo que o desacato estivesse escancarado,  não caberia a prisão em flagrante. E muito menos por obra da defensora.  Aliás, em um primeiro momento, a juíza acertou. Instada pela defensora,  disse que não o prenderia. Mas, em um segundo momento, errou feio ao não  admoestar a defensora, que acabara de cometer um disparate (e não  adianta dizer, agora, que há uma diferença entre “voz de prisão” e  “prisão efetiva”... - sic). Se a defensora desconhecia a lei, a juíza,  então, deveria tê-la corrigido. Com isso, em um terceiro momento, o  Promotor, de acusado, passou à vítima, porque o privaram de sua  liberdade.
LENDAS URBANAS E CORPORATIVISMO
Assim se  formam as “lendas”. A internet está repleta de fofocas, dando conta do  “poder de prisão” da defensora pública. Calma, pessoal. A coisa não é  bem assim. Penso que a própria Defensoria Pública, instituição tão  importante, deveria vir a público para esclarecer isso, para que não  fiquemos apenas com as versões emocionais dos “contendores”. Com  honestidade intelectual, vamos esclarecer para as pessoas que pagam  nossos bons salários, quem, afinal, pode prender em uma seção do  júri...! Ou isso é uma “questão de mera opinião”? Meus leitores entendem  o que quero dizer? Ou a prisão poderia ter sido feita ou não. Mas, por  favor, vamos deixar isso claro, antes que as lendas se consolidem, ao  calor das paixões corporativas. E quando falo de corporativismo,  lembro-me de uma história que se passou comigo. Estava eu no Rio de  Janeiro, convidado para um painel sobre garantias processuais na  Defensoria Pública. No meio das falas, fomos interrompidos - diga-se,  com toda a lhaneza - pelo Defensor-Geral, anunciando que uma defensora  tinha obtido um habeas corpus para um indivíduo acusado de ter matado  parte de uma família, em um caso rumoroso. E todos aplaudiram  entusiasticamente. Tudo bem. Como sou um militante das garantias dos  réus, tendo sido um dos primeiros após  a Constituição a radicalizar  isso, sou insuspeito para falar sobre essas coisas (além disso, várias  vezes escrevi que a ausência de Defensoria nos Estados configura  inconstitucionalidade, além do cabimento de ADPF). Meus livros e minhas  ações falam por mim. Mas - e rogo para que não me entendam mal - naquele  episódio do Rio uma coisa me deixou intrigado e não consigo tirá-la da  cabeça: por que as palmas prolongadas? Precisavam comemorar a soltura do  “cara”? Ou, quem sabe, a exemplo do que possa ter ocorrido no júri  desta semana em Porto Alegre, o acusado era um troféu em disputa? Na  República, réu não rima com troféu... Peço que reflitam a respeito!
Nenhum comentário:
Postar um comentário