domingo, 19 de junho de 2011

Sobre o Congresso em Curitiba (em homenagem ao Jacinto)

Um seguidor do facebook pediu para que eu comentasse o congresso em homenagem ao Jacinto, em Curitiba (maio de 2011). Lá estive e fiz a conferência (palestra) de encerramento da noite de sexta-feira, dia 6 de maio. Decidi levar a sério uma certa promessa que me fiz há pouco tempo, que, aliás, coloquei em prática em Natal e depois em Salvador. Trata-se do "projeto" "vou voltar aos velhos tempos de mim", isto é, resgatar a velha crítica à velha dogmática jurídica. Essa critica eu já a faço desde antes da Constituição de 1988 (na verdade, considero-me "recepcionado pela Constituição", portanto, sou um indivíduo constitucional...!). Pensei que seria necessário retomar a crítica, que tem sua raiz em Luis Alberto Warat e Tercio Ferraz Jr., para referir apenas estes dois. Na palestra em homenagem ao Jacinto, mostrei que a dogmática jurídica é a responsável direta pela crise do direito. Vejamos: o direito penal fracassou. Para verificar isso, basta ver a falta de uma filtragem hermenêutico-constitucional, que, feita seriamente, reduziria o Código Penal à pó. Isso, aliás, venho denunciando há mais de quinze anos. Ou há mais tempo. Um país em que o furto de um botijão de gás feito por duas pessoas tem a pena semelhante à lavagem de dinheiro não pode se dizer democrático no sentido de que fala a Constituição...! Sem contar o "espetáculo" que é a comparação do crime de sonegação de tributos e o de furto, no que tange ao pagamento do "prejuízo". E os livros "manualescos"? Tem livro que ensina que "agressão atual é aquela que está acontecendo e iminente é a que está por acontecer"; "coisa alheia no furto é aquela que não pertence à pessoa"; "cadáver não pode ser vítima de homicídio"; "noite é a total ausência de luz"... Que coisa, não? I rest my case! No processo penal, o fracasso advém do modelo inquisitivo. Veja-se o escândalo que é a noção de "verdade real" assumida pela literatura proecssual penal de terrae brasilis. A doutrina, modo geral, faz um sincretismo teórico entre o paradigma objetivista da metafísica clássica e o paradigma da filosofia da consciência. Isso pode ser visto em autores que vão desde Damásio de Jesus à Ada Pellegrini Grinover. Alguns processualistas sedizentes críticos tentam resolver "a questão da verdade" assumindo uma postura relativista, dizendo que "toda a verdade é relativa"... Que coisa, não? Há um autor que fez uma tese de doutorado para dizer que "cada um tem a sua verdade"...! De todo modo, se alguém quer saber sobre o destino do processo penal, basta ver o "caso Edmundo" ou o "caso Pimenta Neves". Fracasso total! Agora vem aí o "novo" Código de Processo Penal, que resolve o problema da gestão da prova a partir da tese do "livre convencimento". Quer dizer: em pleno paradigma da intersubjetividade, aposta-se na filosofia da consciência. Notícia: o projeto do CPP contém trinta previsões de atuação "de ofício do juiz". O mesmo ocorre no Processo Civil, em que o "novo" CPC também aposta nesse "livre convencimento". Ou seja, para resolver o problema do processo, vamos apostar no protagonismo judicial. Que leitura de Oskar von Bülow, não? Socialismo processual nestes tempos pós-positivistas e de predomínio do paradigma da linguagem? Por isso, disse com todas as letras no Congresso em homenagem ao Jacinto: "o direito traiu a filosofia". Só para frisar: a grande preocupação dos cursos de pós-graduação em direito no Brasil tem sido o acesso à justiça. Pois bem. Desde a lei 8.038/90 o establishment tem construído mecanismos com claro objetivo de obstaculizar a "subida" de recursos ao STJ e STF. Vejam as leis 9.137, 9.756 etc. Vejam as súmulas vinculantes e a repercussão geral. Esse conjunto de mini-reformas, todas gestadas pelos setores "instrumentalistas" da dogmática jurídica, nada resolveram. E por quê? Porque apostaram - e apostam - no protagonismo jduicial, que é o cerne do instrumentalismo...! Tanto nada disso deu certo, que, agora, o Presidente do STF propõe a PEC dos Recursos. O que é isto, senão a confissão de que as mini-reformas fracassaram? A única coisa que ninguém diz é: quem são os responsáveis? A doutrina, no Brasil, não doutrina mais; na verdade, tem sido caudatária daquilo que os Tribunais decidem. Assim, pergunto: qual é o papel dos juristas? Vale a pena estudar? Vale a pena pesquisar? Para que serve a doutrina? Por tudo isso, venho propondo - e deixei isso muito claro em Curitiba - que os setores críticos do direito façam um "constrangimento epistemológico" acerca daquilo que os Tribunais decidem. A doutrina deve doutrinar. A crítica deve criticar. Foi uma conferência que durou 50 minutos, que passou das onze da noite. E ninguém arredou pé. E isso me deixou muito feliz. Por vezes pessimista, nestes momento, me transformo. Bueno. É isso. Aproveito para informar que, na semana que passou, a equipe do Dasein, formado por Clarissa, Ariel, Santiago, Danilo, Fabiano e Rafinha fizeram a revisão da quarta edição do Verdade e Consenso, que sairá pela Saraiva em breve. Saudações.

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